domingo, 20 de setembro de 2009



III Congresso Vocacional do Brasil, mas, por quê?



Esta é a pergunta que fazemos neste tempo em que se divulga e se organiza o III Congresso Vocacional do Brasil, a ser realizado de 3 a 7 de setembro de 2010, em Itaici, São Paulo. Ele terá por tema: “Discípulos-missionários a serviço das vocações”, e por lema: “Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações”. Este novo evento propõe-se a celebrar a caminhada do serviço de animação vocacional, a aprofundar a teologia das vocações na perspectiva do discipulado e da missionariedade, a consolidar a identidade do animador (a) e do serviço de animação vocacional, e a oferecer pistas de ação para o trabalho vocacional.

Pretende-se, ainda, acolher, como horizonte e referência, o Sínodo sobre a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja, e o Documento de Aparecida, com todas as suas indicações. As temáticas desses eventos são pertinentes e decisivas para a questão vocacional. Sem esquecer que recentemente o papa Bento XVI convocou um Ano Sacerdotal, já em andamento, tendo por tema: “Fidelidade de Cristo, fidelidade do sacerdote”, com o objetivo de “fazer perceber sempre mais a importância do serviço e da missão do sacerdote na Igreja e na sociedade contemporânea”.
Mas, verdadeiramente, é necessário mais um congresso? Quais seriam as razões de sua realização? De onde provem esta necessidade? Buscarei responder algumas destas questões na medida em que tive a oportunidade de acompanhar e participar da programação e da realização dos dois eventos precedentes, o primeiro em 1999, e o segundo em 2005, e estou envolvido na preparação deste III Congresso.
Antes de tudo, também nós, da animação e da pastoral vocacional, nos propomos à “grande tarefa de proteger e alimentar a fé do povo de Deus e recordar aos fiéis deste Continente que, em virtude de seu batismo, são chamados a ser discípulos e missionários de Jesus Cristo”. Trata-se de um mandato, uma missão que devemos realizar, o de despertar, discernir, cultivar e acompanhar a vocação dos batizados para que sejam verdadeiramente discípulos-missionários de Jesus Cristo. Esta tarefa protetora e alimentadora da fé, e de memorial, também é nossa e queremos cada vez mais assumi-la integralmente. A primazia deve ser dada à vocação de cada cristão à santidade. A ordem de Jesus é explícita, objetiva, é ir, e fazer discípulos.

A vocação e a missão dos discípulos de Jesus
Texto-base do 3º Congresso Vocacional do Brasil, marcado para setembro de 2010, está sendo elaborado por alguns teólogos indicados pela comissão executiva do congresso. Lema: "Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações" (Mt 28,19).
OS dois congressos vocacionais pre­cedentes também buscaram um texto evangélico para iluminar e enriquecer a reflexão. Às vésperas do Ju­bileu, que celebrou a virada do milênio, refletiu-se sobre a vocação de Bartimeu, adotando como lema do 1 º Congresso a fra­se do evangelho de Marcos: "Coragem! Levanta-te, Ele te chama" (Mc 10,49b). O 2º Congresso Vocacional escolheu a pará­bola dos trabalhadores enviados à vinha, do evangelho de Mateus, para meditar a temática das vocações e ministérios a par­tir do lema: '!Ide também vós para a minha vinha!"(Mt 20,4).
Percebemos nestes congressos, mais do que uma clara base bíblica, o desejo de avançar na reflexão em busca de uma com­ preensão ampla e aberta da temática voca­cional e ministerial na Igreja, comunidade de chamados e enviados. E no 3º Congres­so Vocacional, dentro desta dinâmica, a re­ flexão seguirá novamente Mateus (28,19) para aprofundar o tema: "Discípulos-missionários a serviço das vocações".
Vocação e missão dos discípulos de Jesus.
Na Bíblia toda vocação é para a missão e esta pressupõe um chamado: a vocação. Do contrário, a vocação seria algo estéril, fechada em si mesma, sem comunhão e consequências em prol do reino e de sua justiça. Também não podemos reduzir a missão a uma tarefa posterior ao chamado ou a uma simples dimensão da vocação. A missão não é um acréscimo ou extensão da vocação, mas um componente essencial quer seja ela leiga, religiosa ou sacer­dotal. A missão faz parte do DNA de toda e qualquer vocação.
A vocação tem origem divina: Deus é quem toma a iniciativa e nos chama desde a sua gratuidade. O chamado é graça e o envio também. Tanto a vocação quanto a missão nunca visam o bem pessoal do vocacionado, mas de todo o povo de Deus. A verdadeira vocação e missão não são graças apenas para as pessoas escolhidas, mas para muitos, conforme dizia Jesus referindo-se a sua própria vocação e missão:
"O Filho do Homem não veio para ser ser­vido, mas para servir e dar sua vida como resgate por muitos" (Mt 20,28).
Vocação e missão: dois lados da mesma moeda.
Um autêntico serviço de animação vo­cacional é antes de tudo uma ação evange­lizadora e genuinamente missionária. Nos evangelhos, aquele que chama é o mesmo que envia. Tal realidade confirma que vo­ cação e missão são partes de um binômio inseparável e complementar. Ou, como diz a expressão popular: são dois lados de uma mesma moeda. Lados distintos, cada um com suas características próprias, mas par­tes de uma realidade inseparável, onde uma pressupõe a outra. Na prática, a distinção entre a vocação e a missão é mais de caráter pedagógico que real. Isto significa que precisamos fi­car atentos para evitar certas expressões, como aquelas que escutamos ao falar da "dimensão missionária da vocação". Pois a missão não é uma simples "dimensão", mas elemento constitutivo da identidade de toda vocação e parte integrante do ser­ viço de animação vocacional.
A identidade missionária da Igreja.
A comunidade dos discípulos de Jesus é essencialmente missionária. A missão faz parte da própria natureza e identidade da Igreja.
É impossível pensar numa Igreja não missionária ou indiferente à missão. A comunidade dos seguidores de Jesus existe para a missão e dela procede. Por isso, podemos afirmar com segurança que todas as vocações e ministérios também são de natureza missionária e se fundamentam na missão de Jesus Cristo e do Espírito Santo.
De acordo com uma antiga tradição, o termo "Igreja" encontra sua raiz no livro do Deuteronômio para indicar a comuni­dade de Javé (d. Dt 23,2ss. = "assembléia de Iahweh)". Segundo o evangelho de Mateus, a Igreja é a comunidade dos cha­mados e enviados para dar testemunho do reino e da sua justiça. Mateus é o único evangelista a adotar o termo "Igreja" ao se referir à comunidade dos seguidores de Jesus Cristo (d. Mt 16,18; 18,17). Por isto é conhecido entre os estudiosos como o "evangelho eclesiástico", onde a comuni­dade dos discípulos missionários é chama­ da e enviada por Jesus ressuscitado: "Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28,19).
A Igreja é a comunidade dos chamados e enviados para dar testemunho e servir o reino. Os próprios evangelhos que ela pro­clama são escritos missionários que apre­sentam a pessoa e o projeto de Jesus Cris­to, o reino e a sua justiça. Se de uma parte a Igreja é enviada, de outra ela está sem­ pre enviando os seus discípulos missioná­rios para o serviço da evangelização.
O binômio vocação-missão.
Ao tratar do tema da vocação dos discí­pulos missionários na Bíblia, encontramos um esquema simples e invariável monta­ do a partir de dois verbos: "chamar" e "en­viar".Todo chamado é feito em vista de uma missão, o envio. No Antigo Testamen­to vemos que Deus criou um povo missionário. Deus chama e envia o povo de Isra­el para ser o construtor de seu reino. Os grandes vocacionados e vocacionadas da Bíblia não são apenas modelos de pessoas chamadas, mas também são exemplos de missionários e missionárias enviados a pro­clamar e a construir o reino. Correspon­dendo ao chamado divino e vivendo os va­lores do reino, cada membro do povo de Israel assume sua vocação e missão.
De maneira geral podemos afirmar que no Antigo Testamento Deus é o autor de todos os chamados, enquanto que no Novo Testamento esta função é reservada a Je­sus. Porém, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, todos os vocacionados e vocacionadas são envia­ dos a uma determinada missão.
Não há sequer um único caso onde o tema da vocação apareça desvinculado do envio e da missão. Dizer "sim" ao chama­ do vocacional é o mesmo que acolher a missão ine­ rente a este chamado. A resposta generosa à pro­posta vocacional é também um "sim" ao envio para a missão, que em última ins­tância é uma convocação a colaborar na realização do Projeto de Deus. O imperativo missioná­rio não é uma exclusividade do evangelho de Mateus, mas aparece em todos os evan­gelhos sirr6ticos (cf. Mc 16,15-18; Lc 24,44­ 48). O chamado de Jesus aos vocacional­ dos que pescavam no mar da Galileia, a Levi na coletoria de impostos, ao cego Bartimeu na entrada de Jericó, ou a qual­ quer outra pessoa em qualquer outro lu­gar, não é apenas um convite ao seguimen­to, mas é também uma convocação a assu­mir o projeto do reino e a participar da sua missão (cf. Mc 1,16-20; 10,46-52; Mt 9,9). Independentemente da vocação específica de cada vocacionado, o chamado é sem­pre em vista da missão seja qual for a si­tuação ou lugar do mundo.
No quarto evangelho Jesus se apresen­ ta um grande número de vezes como o enviado do Pai (cf. Jo 5,36.38; 6,29.57; 7,29; 10,36; 11,42; 17,3.8.18; 20,21). Nos evan­gelhos sinóticos ele diz que "veio - vim ­ fui enviado" ou adota outras expressões equivalentes (cf. Mc 1,38; 2,17; 10,45; 12,2­ 8; Mt 5,17; 10,34; 11,27; Lc 4,17-21; 9,48; 10,16; 12,49; 19,10).
Nas cartas de Paulo Jesus também aparece como missionário(cf. Mc 3,13-14 Do Pai, e na carta aos Hebreus ele é chamado de apóstolo (cf. Rm 8,3; 2Cor 8,9; GI4,4; FI 2,7;3,1). No evangelho de Marcos vemos Jesus chamar os discípulos missionários para estarem com ele, in­seri-Ios na sua obra e logo os enviar, confirmando as­ sim a relação entre a voca­ção/chamado e a missão/ envio. Marcos nos mostra de maneira clara que o en­contro pessoal do vocacio­nado com Jesus é uma exi­gência que antecede o envio e o serviço missionário). A missão dos discípulos de Jesus cha­mados a transformar a história pessoal e de toda a humanidade, está situada entre a manhã de Pentecostes e a volta gloriosa do Senhor (cf. At 2,1-13). Os discípulos missionários formam a comunidade dos seguidores de Jesus, comprometidos e pre­parados para a missão de anunciar e cons­truir o reino e sua justiça. Enquanto cha­mados e enviados por Jesus, os discípulos missionários o representam como verda­deiros embaixadores. O próprio Jesus os chamará de [UTF-8?]“pescadores de [UTF-8?]homens” quando os convida ao seguimento desde as margens do mar da Galiléia (d. Mt 4,19; Mc 1,17).
A iluminação bíblica do 3º Congresso Vocacional.
O próximo Congresso Vocacional esco­lheu a passagem bíblica onde encontramos o imperativo missionário de Jesus ressus­citado: "Os onze discípulos caminharam para a Gali1eia, à montanha que Jesus lhes determinara. Ao vê-lo, prostraram-se dian­ te dele. Alguns, porém, duvidaram. Jesus, aproximando-se deles, falou: Todo poder foi me dado no céu e sobre a terra. Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discí­pulos, batizando-as em nome do Pai, do Fi­ lho e do Espírito Santo. E ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consu­mação dos séculos!" (Mt 28,16-20).6.
Esta passagem do evangelho de Mateus, que iluminará a reflexão do 3º Congresso Vocacional do Brasil, aparece após a cena do túmulo vazio, das aparições às mulheres e da corrupção dos soldados que vigiavam o sepulcro de Jesus. Trata-se de uma cena com tonalidade eclesial-missionária em perfeita harmonia com a totalidade do "evan­gelho eclesiástico" de Mateus.
Podemos dividir este texto de Mateus em quatro pequenas partes articuladas entre si: a primeira traz a indicação de voltar à Galileia e se encontrar com o Res­ suscitado (vv. 16-17). A segunda consiste na solene proclamação de Jesus que rece­beu de Deus o poder universal (v. 18). A terceira parte é o imperativo missionário (v. 19). A última parte é a garantia da pre­sença do Ressuscitado junto aos discípu­los missionários (v. 20).
a) Galileia: um novo começo:
Regressar à Galileia é retomar ao co­ meço para iniciar uma nova caminhada vocacional e missionária com mais consistência e maturidade. Também é um convi­te a valorizar as próprias raízes, a repen­sar os projetos e as opções. É um novo chamado vocacional que nos permite re­ começar com uma nova fé e uma nova es­perança. A primeira missão que os discí­pulos receberam não foi a de realizar uma tarefa e apresentar os resultados, mas a de caminhar ao encontro do Ressuscitado. A experiência com o Ressuscitado toma­ se, assim, o ponto de partida da atividade missionária. A missão não será outra coi­sa senão a comunicação desta experiência de encontro com Jesus Cristo vivo na Galileia, lugar da vida e da missão.
b) A autoridade
Jesus transmite sua autoridade aos dis­cípulos missionários. Eles recebem a au­toridade para construir o reino e sua justi­ça. Trata-se do poder de ser servidores do reino e continuadores da obra de Jesus, que tem autoridade divina e humana, isto é, "no céu" e "na terra". O Ressuscitado dá aos onze discípulos missionários o poder de servir ao reino e nunca usá-lo em benefi­cio próprio. Eles representam toda a Igre­ja chamada a servir e a proclamar a vonta­de de Deus.
c) A missão não conhece fronteiras:
A missão indicada por Jesus Cristo supera as fronteiras, não exclui nenhum povo e alcança "todas as nações". Os discípulos missionários são enviados não apenas às "ovelhas perdidas de Israel", mas ao mun­ do inteiro para fazerem discípulos do rei­ no e da sua justiça. Do mesmo modo que esta missão ultrapassa as fronteiras de Israel, ela também supera os limites do tem­po, devendo se estender até "a consuma­ção dos séculos". Quem conduz os discí­pulos missionários e toda a Igreja é o Es­pírito Santo.
d) Jesus está com eles
No final da cena Mateus deixa claro que Jesus ressuscitado é Deus morando no meio de nós para sempre. Os discípulos missionários caminham com a certeza de que aquele que os chamou estará sempre presente no meio deles. Jesus dá todas as garantias aos discípulos de que jamais os abandonará. Ele é o "Emanuel - Deus conosco" - que acompanha seus vocacio­nados até "a consumação dos séculos".
Missão de todos e de cada um
Jesus não confiou a missão evangeliza­dora a Pedro ou a um dos apóstolos, mas aos onze, que representam toda a Igreja chamada a edificar o reino. Porém, são di­ferentes as maneiras de desenvolver a missão quando consideramos a variedade dos carismas e ministérios suscitados pelo Espírito Santo nas comunidades. Pelo Ba­tismo todos são chamados e convocados à missão. Mas cada vocação específica tem formas próprias de participar da missão evangelizadora da Igreja.
Os ministros ordenados (diáconos, pa­dres e bispos) dedicam-se totalmente ao serviço evangelizador (d. Presbyterorum Ordinis, 3).A pessoa vocacionada ao minis­tério ordenado é chamada a se colocar inte­gralmente a serviço da Igreja e de sua cau­sa: a evangelização. Os chamados e cha­madas à vida consagrada sabem que sua vocação é essencialmente missionária, uma vez que são testemunhas e anunciadores do reino no meio das realidades do mundo. De igual maneira os cristãos leigos e leigas são convocados a serem "sal da terra e luz do mundo" (Mt 5,13-16). Ou, como afirma o documento de Puebla: "Os cristãos lei­gos são homens e mulheres da Igreja no co­ ração do mundo, homens e mulheres do mundo no coração da Igreja" (n. 786).Gilson Luiz Maia Religioso Rogacionista e sacerdote
Ordenação Presbiteral de Hesron Vagner, da Diocese de Santarém, em agosto/2009
Descobrir a alegria de seguir Jesus,
eis o sentido verdadeiro da vida.







O CREDO DO CHAMADO.

Cremos que Deus nos escolheu antes da fundação do mundo.Para sermos santos e irrepreensíveisDiante dele no amor. ( Ef 1,4 )
Cremos que os que de antemão ele conheceu.Esses também predestinou a seremConformes à imagem do seu Filho. ( Rm 8,29 )
Cremos que aquele que nos escolheu desde o seio materno,Nos chamou por sua graça e houve por bemRevelar em nós o seu FilhoPara que o anunciássemos. ( Gl 1, 15-16 )Porque aquele que nos chamou é FIEL. ( Fil 1,6 ; 1 Ts 5,24 ).
Cremos que Deus nos salvouE nos chamou com uma vocação santa,Não em virtude de nossas obras,Mas de seu próprio designio e graça,Que nos foi dada em Cristo Jesus, desde a eternidade. ( 2 Tm 1,9 )
Cremos que Cristo Jesus nos julgou digno de confiança,Tomando-nos para o seu serviço. ( 1 Tm 1,12 )
Cremos ser apóstolos por vocação,Servos de Cristo Jesus,Escolhidos para anunciar o Evangelho de Deus. ( Rm 1,1 )
Cremos que Deus escolheu o que é loucura para o mundoPara confundir os sábios,A fim de que a nossa fé não se baseie na sabedoria humana,Mas sobre o poder de Deus. ( 1 Cor, 1,27; 2,5 )
Cremos que a cada um Deus concedeuUma manifestação do EspíritoPara a utilidade de todos. ( 1 Cor 12, 7 )
Cremos que devemos comportar-nos de uma maneira dignaDa vocação a que fomos chamados:Com toda humildade, paciência e mansidão,Procurando crescer em tudo em direção a Ele. ( Ef 4,1-2 )
Cremos que tudo concorre para o bemDaqueles que amam a Deus,Daqueles que são chamados segundo o seu desígnio. ( Rm 8,28 )
Cremos naquele que é poderoso para realizar por nósEm tudo infinitamente além do que pedimos ou pensamos,Segundo o poder que já opera em nós. ( Ef 3,20 )

Cremos que temos plena certeza de queAquele que começou em nós a boa obraHá de levá-la a perfeição até o dia de Jesus Cristo,

III CONGRESSO VOCACIONAL DO BRASIL



Tema: “Discípulos missionários a serviço das vocações”
Lema: “Ide, pois, fazer discípulos entre as nações” (cf. Mt 28,19)
Indaiatuba, Itaici, 03 a 07 de setembro de 2010






ORAÇÃO


Trindade Santa,
Deus da vida e do amor,
somos seguidoras e seguidores de Jesus,
discípulos missionários a serviço das vocações.
Como animadores vocacionais,
queremos responder ao mandato de Jesus
de “fazer discípulos entre todas as nações”,
incentivando a vocação
dos cristãos leigos e leigas,
à vida consagrada e
aos ministérios ordenados
construindo uma Igreja corresponsável e ministerial.
Buscamos uma Igreja fiel aos sinais dos tempos,
samaritana, missionária e libertadora,
que responda ao clamor do povo,
em suas lutas e esperanças;
e que testemunhe a Boa Nova do Reino,
com a palavra e com a vida.
Que Maria, a mãe de Jesus,
e tantas testemunhas fiéis até o martírio,
intercedam a benção
para o III Congresso Vocacional do Brasil
Amém.


No próximo dia 19 de junho, o Papa Bento XVI inaugurará na Basílica de São Pedro
o Ano Sacerdotal,
com o tema:
“Fidelidade de Cristo, fidelidade do sacerdote”.

Entrevista com o cardeal Claudio Hummes, prefeito da Congregação para o Clero

No próximo dia 19 de junho, o Papa Bento XVI inaugurará na Basílica de São Pedro o Ano Sacerdotal, com o tema: “Fidelidade de Cristo, fidelidade do sacerdote”.Durante este ano, Bento XVI proclamará São João Maria Vianney como “padroeiro de todos os sacerdotes do mundo”. Igualmente, será publicado o “Diretório para os confessores e diretores espirituais”, assim como uma recopilação de textos do Papa sobre temas essenciais da vida e da missão sacerdotal na época atual.Zenit conversou com o cardeal brasileiro Claudio Hummes, O.F.M., prefeito para a Congregação do Clero e bispo emérito de São Paulo, que apresenta este ano como “propositivo” e como uma oportunidade para que os sacerdotes recordem que “a Igreja os ama, que se preocupa com eles”.– Qual é o principal objetivo do ano sacerdotal?– Cardeal Hummes: Em primeiro lugar, a circunstância. Será um ano jubilar pelos 150 anos da morte de São João Maria Vianney, mais conhecido como o Santo Cura de Ars. Esta é a oportunidade, mas o motivo fundamental é que o Papa quer dar aos sacerdotes uma importância especial e dizer quanto os ama, quanto os quer ajudar a viver com alegria e com fervor sua vocação e missão.Esta iniciativa do Papa acontece em um momento de grande expansão de uma nova cultura: hoje domina a cultura pós-moderna, relativista, urbana, pluralista, secularizada, laicista, na qual os sacerdotes devem viver sua vocação e sua missão.O desafio é entender como ser sacerdote neste novo tempo, não para condenar o mundo, mas para salvar o mundo, como Jesus, que não veio para condená-lo mas para salvá-lo.O sacerdote deve fazer isso de coração, com muita abertura, sem “demonizar” a sociedade. Deve estar integrado nela com a alegria missionária de querer levar as pessoas desta sociedade a Jesus Cristo.É necessário dar uma oportunidade para que todos orem com os sacerdotes e pelos sacerdotes, convocar os sacerdotes a orar, fazê-lo da melhor maneira possível na sociedade atual e também, eventualmente, tomar iniciativas para que os sacerdotes tenham melhores condições para viver sua vocação e a missão.É um ano positivo e propositivo. Não se trata, em primeiro lugar, de corrigir os sacerdotes. Há problemas que sempre devem ser corrigidos e a Igreja não pode fechar os olhos, mas sabemos que a grande maioria dos sacerdotes tem uma grande dignidade e adere ao seu ministério e à sua vocação. Dão sua vida por esta vocação que aceitaram livremente.Lamentavelmente, existem os problemas dos quais nos inteiramos nos últimos anos relativos à pedofilia e outros delitos sexuais graves, mas, como máximo, talvez podem chegar a 4% do clero. A Igreja quer dizer aos 96% restantes que estamos orgulhosos deles, que são homens de Deus e que queremos ajudá-los e reconhecer tudo o que fazem como testemunho de vida.É também um momento oportuno para intensificar e aprofundar a questão de como ser sacerdotes neste mundo que muda e que Deus colocou diante de nós para ser salvo.– Por que o Papa apresentou São João Maria Vianney como modelo para os sacerdotes?– Cardeal Hummes: Porque há muito tempo é o padroeiro dos párocos. Faz parte do mundo do presbítero. Queremos também estimular várias nações e conferências episcopais ou igrejas locais para que escolham algum sacerdote exemplar de sua área, apresentá-lo ao mundo e aos jovens. Homens e sacerdotes que sejam verdadeiramente modelos, que possam inspirar e possam renovar a convicção do grande valor e da importância do ministério sacerdotal.– Para o senhor, como sacerdote, qual é o aspecto mais belo de sua vocação?– Cardeal Hummes: Esta pergunta me faz recordar um fato de São Francisco de Assis: Ele disse uma vez: “Se me encontrasse pelo caminho com um sacerdote e um anjo, saudaria primeiro o sacerdote e depois o anjo. Por quê? Porque o sacerdote é quem nos dá Cristo na Eucaristia”. Isto é o mais fundamental e maravilhoso: o sacerdote tem o dom e a graça de Deus para ser ministro deste grande mistério da Eucaristia.O sacerdócio foi instituído por Jesus Cristo na Última Ceia. Quando disse “Fazei isto em memória de mim”, deu aos apóstolos este mandamento e também o poder de fazer isto, de fazer o mesmo que Jesus fez na última ceia. E estes apóstolos transmitiram, por sua vez, este ministério e este poder divino aos homens que são bispos e sacerdotes.Isto é o mais importante e o centro. A Eucaristia é o centro da Igreja. O Papa João Paulo II disse que a Igreja vive da Eucaristia. O sacerdote é o ministro deste grande sacramento, que é o memorial da morte de Jesus.E depois temos também o sacramento da Reconciliação. Jesus disse: “A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados” (Jo 20, 23). Veio para reconciliar o mundo com Deus e os seres humanos entre eles. Deu o Espírito Santo aos apóstolos, soprando sobre eles.Ele deu aos apóstolos, em nome de Deus e seu, aquilo que havia adquirido com seu sangue e com sua vida na Cruz, transformando a violência em um ato de amor para o perdão dos pecados. E disse aos apóstolos que serão os ministros deste perdão. Isto é fundamental para todos. Cada um quer ser perdoado de seus pecados, estar em paz com Deus e com os demais. O mistério da reconciliação é muito importante na vida do sacerdote.Há outras muitas ações, como a evangelização, o anúncio da pessoa de Jesus Cristo morto e ressuscitado, de seu reino. O mundo tem direito de saber e conhecer Jesus Cristo e tudo o que significa seu Reino. Este é um ministério específico também do sacerdote, que compartilha com os bispos e com os leigos, que fazem o anúncio da Palavra e devem levar as pessoas a um encontro intenso e pessoal com Jesus Cristo.
– Como o senhor acha acha que deve ser a formação de um seminarista nos âmbitos pessoal, espiritual, intelectual e litúrgico? Que aspectos acha que não podem faltar?– Cardeal Hummes: A Igreja fala de quatro dimensões que devem ser cultivadas com os candidatos.Em primeiro lugar, a dimensão humana, a afetiva – toda questão de sua pessoa –, sua natureza, sua dignidade e uma maturidade afetiva normal. Isso é importante, porque é a base.Depois está a dimensão espiritual. Hoje nos encontramos diante de uma cultura que já não é nem cristã nem religiosa. Portanto, é ainda mais necessário desenvolver bem a espiritualidade nos candidatos.Existe também a dimensão intelectual. É necessário estudar filosofia e teologia para que os sacerdotes sejam capazes de falar e de anunciar Jesus Cristo e sua mensagem hoje, de modo que se evidencie toda a riqueza do diálogo entre a fé e a razão humana. Deus é o Logos de tudo e Jesus Cristo é sua explicação.Depois, obviamente, está a dimensão de apostolado, ou seja, deve-se preparar estes candidatos para ser pastores no mundo de hoje. Neste âmbito pastoral, hoje é muito importante a identidade missionária. Os sacerdotes devem ter não só uma preparação, mas também um estímulo forte para não limitar-se só a receber e oferecer o serviço àqueles que vem para vê-los, mas também para sair em busca das pessoas que não vão à Igreja, sobretudo daqueles batizados que se afastaram porque não foram suficientemente evangelizados, e que têm o direito de sê-lo, porque prometemos levar Jesus Cristo, educar na fé.Isso muitas vezes não se fez ou se fez muito pouco. O sacerdote deve ir em missão e preparar sua comunidade para que vá anunciar Jesus Cristo às pessoas, ao menos àqueles que estão no território de sua paróquia, mas também mais além desta.Hoje, esta dimensão missionária é muito importante. O discípulo se converte em missionário com sua adesão entusiasta, alegre a Cristo, capaz de revestir d’Ele incondicionalmente toda sua vida. Devemos ser como os discípulos: fervorosos, missionários, alegres. Nisto consiste a chave, o segredo.– Que atividades especiais vão realizar neste ano, tanto para os jovens como para os próprios sacerdotes?– Cardeal Hummes: Haverá iniciativas no âmbito da Igreja universal, mas o ano do sacerdote deve ser celebrado também a nível local. Ou seja, nas igrejas locais, nas dioceses e nas paróquias, porque os sacerdotes são os ministros do povo e devem incluir as comunidades.As dioceses devem impulsionar iniciativas tanto de aprofundamento como de celebração, para levar aos sacerdotes a mensagem de que a Igreja os ama, respeita, admira e se sente orgulhosa deles.O Papa abrirá o Ano Sacerdotal em 19 de junho, na festa do Sagrado Coração de Jesus, porque é a Jornada Mundial de Oração pela Santificação dos Sacerdotes. Haverá vésperas solenes celebradas na basílica vaticana, estará presente a relíquia do Cura d’Ars. Seu coração estará na Basílica como sinal da importância que o Papa quer dar aos sacerdotes. Esperamos que muitos sacerdotes estejam presentes.O encerramento acontecerá um ano depois. Ainda está por definir-se a data exata do grande encontro do Papa com os sacerdotes, ao qual estão convidadas todas as dioceses. Haverá outras muitas iniciativas. Estamos pensando também em realizar um congresso teológico internacional nos dias precedentes ao encerramento. Também haverá exercícios espirituais. Esperamos também poder envolver as universidades católicas, para que possam aprofundar no sentido do sacerdócio, na teologia do sacerdócio e em todos os temas que são importantes para os sacerdotes.– O senhor poderia falar-nos agora dos desafios que um sacerdote enfrenta nesta sociedade tão antirreligiosa? Como crê que pode permanecer fiel a sua vocação?– Cardeal Hummes: Em primeiro lugar, a Igreja, através de seus seminários e formadores, deve fazer uma seleção muito rigorosa dos candidatos. Depois, é necessário ter uma boa formação, fundamentalmente na dimensão humana, intelectual, espiritual, pastoral e missionária. É fundamental recordar que o sacerdote é discípulo de Jesus Cristo e estar seguro de que tenha tido este encontro pessoal e comunitário intenso com Jesus Cristo, tenha lhe dado sua adesão. Cada missa pode ser um momento muito forte para este encontro. Mas também a leitura da Palavra de Deus.Como dizia João Paulo II, há muitas oportunidades para testemunhar o encontro com Jesus Cristo. É fundamental ser um missionário capaz de renovar este zelo sacerdotal, de sentir-se alegre e convencido de sua missão e de conscientizar-se de que isso tem um sentido fundamental para a Igreja e para o mundo.Sempre digo que os sacerdotes não são importantes só pelo aspecto religioso dentro da Igreja. Desempenham também um grandioso trabalho na sociedade, porque promovem os grandes valores humanos, estão muito perto dos pobres com a solidariedade, a atenção pelos direitos humanos. Creio que devemos ajudá-los para que vivam esta vocação com alegria, com muita lucidez e também com coração, para que sejam felizes, dado que se pode ser feliz no sacrifício e no cansaço.Ser feliz não está em contradição com o sofrimento. Jesus não era infeliz na cruz. Sofria tremendamente, mas estava feliz, porque sabia que o fazia por amor e que isto tinha um sentido fundamental para a salvação do mundo. Era um gesto de fidelidade a seu Pai.– Que outros santos o senhor acha acha que podem ser modelos para o sacerdote de hoje?– Cardeal Hummes: Obviamente, o grande ideal é sempre Jesus Cristo, o Bom Pastor. No caso dos apóstolos, sobretudo São Paulo. Celebramos o Ano Paulino. Vê-se que ele era uma figura realmente impressionante e que pode ser sempre uma grande inspiração para os sacerdotes, sobretudo em uma sociedade que já não é cristã.Cruzou as fronteiras de Israel para ser apóstolo dos gentios, dos pagãos. Em um mundo que está se afastando tanto de qualquer manifestação religiosa, seu exemplo é fundamental. São Paulo tinha esta consciência muito forte: Jesus veio para salvar, não para condenar. É a mesma consciência que devemos ter nós diante do mundo de hoje.

III CONGRESSO VOCACIONAL DO BRASIL


“Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações” (cf. Mt 28,19)



A realização do 3º Congresso Vocacional do Brasil foi aprovada pela comissão Episcopal Pastoral para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada (CMOVC) em sua 6ª Reunião ampliada, em outubro de 2008. A sua organização e efetivação foram entregues à Comissão Executiva que conta com a presidência de Dom Leonardo Ulrich Steiner, bispo de São Félix – MT e membro da CMOVC. O processo está em plena execução.

O Congresso terá lugar em Itaici - São Paulo, nos dia 03 a 07 de setembro de 2010.

No caminho do Discipulado Missionário



Introdução:


Para a vida de cada cristão e para a vida da Igreja, é de grande importância a convicção de que é Deus mesmo quem toma a iniciativa para vir ao nosso encontro. Nele está a fonte do chamado para o seguimento a Jesus Cristo; para a vivência da Missão; e a vivência em Comunhão. A CMOVC, à luz do Documento de Aparecida e das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (2008-2010), deseja aprofundar, em seu âmbito de atuação, esses eixos fundamentais. A vivência desse caminho na Igreja e na sociedade só é possível peça ação do Espírito Santo que dinamiza a vida da comunidade e consolida-a com vocações específicas, sempre a serviço da edificação do Povo de Deus. Para tanto, precisamos dar atenção à formação como necessidade e desafio.

“A condição do discípulo brota de Jesus Cristo como de sua fonte, pela fé e pelo batismo, e cresce na Igreja, comunidade onde todos os seus membros adquirem igual dignidade e participam de diversos ministérios e carismas. Desse modo, realiza-se na Igreja a forma própria e específica de viver a santidade batismal as serviço do Reino de Deus” (DA 184).

Quando cada pessoa toma consciência de que é chamada por Deus para seguir Jesus Cristo fazendo parte da vida em comunidade e de que o mesmo Deus lhe concede a graça do Espírito Santo para testemunhar essa experiência de fé na família, na comunidade e na sociedade, ela sabe que não se trata de missão por conta própria, mas na comunhão com Jesus Cristo. Esta graça precisa ser continuamente cultivada de modo pessoal e na comunhão com a comunidade.

As pessoas que têm uma vocação e missão específicas necessitam ainda mais encontrar meios para esse cultivo e aprofundamento, pois se trata de fazer, como discípulo missionário, a experiência do encontro com Jesus Cristo nessa realidade em constante transformação e tão desafiadora. “Cada uma das vocações tem um modo concreto e diferente de viver a espiritualidade, que dá profundidade e entusiasmo para o exercício concreto de suas tarefas. Dessa forma, a vida no Espírito não nos fecha em intimidade cômoda e fechada, mas sim nos torna pessoas generosas e criativas, felizes no anúncio e no serviço missionário.Torna-nos comprometidos com os reclamos da realidade e capazes de encontrar nela profundo significado em todo o que nos cabe fazer pela Igreja e pelo mundo” (DA 285).



I. Chamados ao seguimento de Jesus Cristo.

“Segue-me” (Mc 2,14)


Jesus Cristo sempre toma a iniciativa para chamar os discípulos, para escolher os doze, para formá-los e para enviá-los. Assim, vai acontecendo um profundo relacionamento entre os discípulos e o Mestre; pois ele “constituiu Doze para que ficassem com Ele e para enviá-los a pregar, e terem autoridade para expulsar os demônios” (Mc 3,14-15).

Os discípulos vão descobrindo toda a beleza da vida do Mestre a partir do encontro com ele e sentem entusiasmo em segui-lo. Mesmo que tudo ainda não seja claro para eles, a experiência da vivência com Jesus Cristo vai lhes indicando que ele é o Mestre missionário, amigo dos publicanos e pecadores, que está sempre saindo ao encontro: “Jesus percorria todas as cidades e povoados ensinando em suas sinagogas e pregando o Evangelho do Reino, enquanto curava toda sorte de doenças e enfermidades” (Mt 9,35).

Mas, Jesus vai percebendo a fragilidade na vida deles e prepara-os para que possam abraçar a missão que passa pela renúncia de si mesmos, pelo sofrimento (Mc 8,34), pela entrega da vida: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mc 10,45). No processo de formação, Jesus está sempre dirigindo-lhes a palavra, dando-lhes particular atenção (Mc 4,10.34; 8,31; 9,30-31; 10,32-33.42; 14,17.28; 16,14), para que estejam vivenciando a comunhão com o Mestre: “Dei-vos o exemplo, para que, como eu vos fiz, também vós o façais (...) Se compreenderdes isso e o praticardes, felizes sereis” (Jo 13,15.17).

Ele sabe que veio para reunir e guiar aqueles que são atraídos pelo Pai e lhe são entregues: “Por eles eu rogo; não rogo pelo mundo, mas pelos que me deste, porque são teus” (Jo 17,9).

Depois de ressuscitado, Jesus continua saindo ao encontro dos discípulos. Em primeiro lugar daqueles dois na estrada de Emaús e, em seguida, da comunidade toda, como encontramos no evangelho de Lucas (24,13ss). A experiência do encontro torna-se fundamental para que a motivação seja renovada. Nesse encontro, Jesus parte da situação de desencanto que está sendo vivenciada pelos discípulos. Percebendo que vêem a realidade a partir de si mesmos, Jesus pergunta e deixa que falem.

6. Depois de escutá-los, Jesus faz observações à visão que expressam e questiona-os. “E, começando por Moisés e por todos os Profetas, interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito” (Lc 24,27). Mostra-lhes o significado profundo do que estava acontecendo. Esse tempo que Jesus dedica para clarear a visão deles é muito importante, mas não foi suficiente. Um outro passo aconteceu na celebração da partilha do pão. Aí, os seus olhos se abriram. E mesmo assim, houve necessidade da confirmação da experiência na comunidade dos discípulos. Foi então que “abriu-lhes a mente para que entendessem as Escrituras” (Lc 24,45) e explicou-lhes o sentido do seu sofrimento, da entrega de sua vida. No acompanhamento que Jesus faz, há um destaque especial para a Palavra e para “a partilha do pão” que ele abençoa e distribui, como lugares de encontro com o ressuscitado.

7. Porém, não basta caminhar com Jesus, escutá-lo, ver suas obras. Muitos estavam com Ele, mas não haviam descoberto a pessoa e a missão de Jesus a partir dEle. A visão que predominava em seus corações era aquela de um Messias glorioso que libertaria o povo, traria vantagens e privilégios para seus adeptos e reinaria sem passar pelo sofrimento, ainda mais pela morte na cruz. Por isso, não o acolhem logo como ele é: aquele que sofreu, foi crucificado e os acompanhava vivo.

8. Na verdade, vemos como há todo um processo na vida dos discípulos. Antes, seus olhos estavam impedidos de reconhecê-lo. Agora, eles o reconhecem na ceia, mas Jesus se torna invisível diante deles (Lc 4,31). Então, o que é fundamental na experiência do seguimento a Jesus Cristo, o que precisa marcar o caminho espiritual do discípulo?

9. Jesus se dá a conhecer na comunidade reunida. A experiência dos dois não os isola da comunidade; ao contrário, motiva-os para que voltem à comunidade. Mas, mesmo depois de contarem e escutarem as experiências do encontro, ainda existem dúvidas em seus corações. Assim, não reconheceram Jesus quando se apresentou no meio deles e disse: “A paz esteja convosco!” (Lc 24,36). É o próprio Jesus que vai apresentar-lhes as mãos e os pés e come um pedaço de peixe para fazer-lhes ver que se trata dele mesmo. “Então, abriu-lhes a mente para que entendessem as Escrituras, e disse-lhes: “Assim está escrito que o Cristo devia sofrer e ressuscitar dos mortos ao terceiro dia, e que, em seu Nome, fosse proclamado o arrependimento para a remissão dos pecados a todas as nações, a começar por Jerusalém.” (Lc. 24, 45-47). Na comunidade dos discípulos, é que é confirmada a experiência do encontro feita anteriormente de modo pessoal e em pequenos grupos. Jesus, outra vez, toma a iniciativa de ir ao encontro dos seus discípulos, agora reunidos. Ele sabe da importância da comunidade dos discípulos para a missão. Por isso, lhe dá atenção, explicando o significado de tudo o que havia acontecido com ele. É necessário que a comunidade seja realmente comunidade de testemunhas do ressuscitado; pois se trata de vivenciar, celebrar e anunciar o que na verdade aconteceu e que faz parte da experiência pessoal e comunitária: “Isso que vimos e ouvimos, nós vos anunciamos” (1Jo 1,3). Sem esta experiência constante da presença do Mestre, sem estar nessa comunhão profunda com aquele que chama e envia, a comunidade não será comunidade de discípulos missionários. É Jesus mesmo quem afirma: “Vós sois as testemunhas dessas coisas” (Lc 24,48). Para levar adiante a missão, a comunidade dos discípulos vai acolher como graça a convicção de que não estará sozinha e aprofundá-la a cada momento, pois contará com a força do Espírito de Deus: “Eu enviarei sobre vós o que meu Pai prometeu. Por isso, permanecei na cidade até que sejais revestidos da força do Alto” (Lc 24,49). Aquele mesmo que consagrou Jesus para a missão, também consagra os discípulos dele para que continuem a obra que é de Deus.

10. A comunidade, no caminho de Jesus Cristo, precisa aprender a sair ao encontro das pessoas, de grupos e outras comunidades; a sair em missão, a se reunir e celebrar, a ser testemunha e dar testemunho. Em 1975, o papa Paulo VI já considerava que é importante realçar “para a Igreja, o testemunho de uma vida autenticamente cristã, entregue nas mãos de Deus, numa comunhão que nada deverá interromper, e dedicada ao próximo com um zelo sem limites, é o primeiro meio de evangelização. “O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres – dizíamos ainda recentemente a um grupo de leigos – ou então se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas”. (...) Será pois, pelo seu comportamento, pela sua vida, que a Igreja há de, antes de mais nada, evangelizar o mundo; ou seja pelo seu testemunho vivido com fidelidade ao Senhor Jesus, testemunho de pobreza, de desapego e de liberdade frente aos poderes deste mundo; numa palavra, testemunho de santidade”. (EN 41).

11. Na vivência do seu testemunho, a comunidade é chamada a reconhecer as chagas vivas de Cristo na vida das pessoas, das famílias, dos jovens, das comunidades, de todos os excluídos. Guiada pelo Espírito Santo, a comunidade se deixará interpelar pelos que sofrem e, será iluminada para que seus membros sejam discípulos missionários obedecendo ao Evangelho: “Vai e faze tu a mesma coisa” (Lc 10, 37).

12. Mergulhando no Mistério da Páscoa de Jesus Cristo, o discípulo encontra a força de Deus que o faz entrar na realidade em que vive para descobrir que já foi redimido pela entrega da vida de Jesus. O que lhe falta é abrir, sem reservas, sua vida para acolher a graça que lhe é concedida no encontro com aquele que morreu e ressuscitou e que, continua saindo ao encontro dos filhos e filhas amados de Deus para reunir o que está disperso (Cf. Jo 11,52).

13. O Documento de Aparecida, ressaltando a importância da experiência do encontro pessoal com Jesus Cristo, mostra que a vivência da fé pede necessariamente a ligação-pertença a uma comunidade de fé. “Também hoje o encontro dos discípulos com Jesus na intimidade é indispensável para alimentar a vida comunitária e a atividade missionária. Os discípulos de Jesus são chamados a viver em comunhão com o Pai (1Jo 1,3) e com seu Filho morto e ressuscitado, na “comunhão no Espírito Santo” (1Cor 12,13” (...) A vocação ao discipulado missionário é con-vocação à comunhão em sua Igreja. Não há discipulado sem comunhão. Diante da tentação, muito presente na cultura atual, de ser cristãos sem Igreja e das novas buscas espirituais individualistas, afirmamos que a fé em Jesus Cristo nos chegou através da comunidade eclesial e ela “nos dá uma família, a família universal de Deus na Igreja Católica. A fé nos liberta do isolamento do eu, porque nos conduz à comunhão” (DI 3). Isso significa que uma dimensão constitutiva do acontecimento cristão é o fato de pertencer a uma comunidade concreta na qual podemos viver uma experiência permanente de discipulado e de comunhão com os sucessores dos Apóstolos e com o Papa” (DA 154.155.156). Sendo assim, a dimensão comunitária não é uma dimensão entre outras, mas precisa acompanhar e perpassar todas as dimensões da formação humana.



II. Chamados para a vivência da Missão

“Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações” (Mt 28,19)



1. “O testemunho que o Senhor dá de si mesmo e que São Lucas recolheu no seu Evangelho – “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades” (Lc 4,43) – tem, sem dúvida nenhuma, uma grande importância, porque define, numa frase apenas, toda a missão de Jesus: “É para isso que fui enviado” (Lc 4,43). Estas palavras assumem o seu significado pleno se se confrontam com os versículos anteriores, nos quais Cristo tinha aplicado a si próprio as palavras do profeta Isaías: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me ungiu, para anunciar a boa Nova aos pobres” (Lc 4,18) (EN 6).

2. Jesus é o missionário do Pai. Em sua vida e missão, encontra-se a perfeita sintonia entre a mensagem e o mensageiro, entre o dizer, o fazer e o ser. Vivenciando a anunciando a Boa Nova do Reino de Deus, ele, ao mesmo tempo, dá sinais da presença do Reino e vai convocando e formando pessoas para que possam acolher a missão, o mandato que ele deixa: “Ele os enviou para anunciar o Reino de Deus e curar os enfermos” (Lc 9,2).

3. “O Reino diz respeito a todos: às pessoas, à sociedade, ao mundo inteiro. Trabalhar pelo Reino significa reconhecer e favorecer o dinamismo divino, que está presente na história humana e a transforma. Construir o Reino quer dizer trabalhar para a libertação do mal, sob todas as suas formas. Em resumo, o Reino de Deus é a manifestação e a atuação de seu desígnio de salvação, em toda a sua plenitude” (RM 15).

4. Trata-se então do “Reino da vida, porque a proposta de Jesus Cristo a nossos povos, o conteúdo fundamental dessa missão, é a oferta de vida plena para todos” (DA 361). Mas, “as condições de vida de muitos abandonados, excluídos e ignorados em sua miséria e dor, contradizem a esse projeto do Pai e desafiam os cristãos a maior compromisso a favor da cultura da vida. O Reino de vida que Cristo veio trazer é incompatível com essas situações desumanas. (...) Tanto a preocupação por desenvolver estruturas mais justas como por transmitir os valores sociais do Evangelho, situam-se neste contexto de serviço fraterno à vida digna. Descobrimos, dessa forma, uma profunda lei da realidade: a vida só se desenvolve plenamente na comunhão fraterna e justa. Porque Deus em Cristo não redime só a pessoa individual, mas também as relações sociais entre os seres humanos” (DA 358 e 359). Sendo assim, a missão, como vivência do seguimento a Jesus Cristo, é caminho para a vida plena.

5. Como nos lembra o Documento de Aparecida, “ao chamar os seus para que o sigam, Jesus lhes dá uma missão muito precisa: anunciar o Evangelho do Reino a todas as nações (cf. Mt 28,19; Lc 24,46-48). Por isso, todo discípulo é missionário, pois Jesus o faz partícipe de sua missão, ao mesmo tempo que o vincula a Ele como amigo e irmão. Dessa maneira, como Ele é testemunha do mistério do Pai, assim os discípulos são testemunhas da morte e ressurreição do Senhor até que ele retorne. Cumprir essa missão não é tarefa opcional, mas parte integrante da identidade cristã, porque é a extensão testemunhal da vocação mesma” (DA 144).


6. A missão vem de Jesus Cristo, no seu Espírito. Essa missão é dada à Igreja. “Foi-me dada toda a autoridade no céu e na terra. Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28 18-20).

7. Na verdade, a missão não pode ser vivenciada por conta própria. Ela decorre do chamado que passa pela experiência do encontro pessoal com Jesus Cristo ressuscitado, levando a pessoa a ser testemunha dEle na comunidade e na sociedade, sob a guia do Espírito Santo. Esta experiência é tão marcante que torna “a missão inseparável do discipulado. Este não deve ser entendido como etapa posterior à formação, ainda que esta seja realizada de diversas maneiras de acordo com a própria vocação e com o momento da maturidade humana e cristã em que se encontre a pessoa” (DA 278 e). O discípulo missionário é sempre enviado em nome de Cristo e da Igreja: “Como o Pai me enviou também eu vos envio” (Jo 20,21).

8. Na experiência dos apóstolos, a Igreja encontra caminhos importantes para a vivência da missão. No exemplo de Pedro, vê como o Espírito Santo vai quebrando sua resistência para que possa ir ao encontro da família do Centurião Cornélio. Assumindo este passo, Pedro torna-se sinal de como o Espírito de Deus não só acompanha a missão, mas a prepara e vai abrindo o caminho na vida de evangelizadores e dos que estão sendo evangelizados em vista da transformação necessária no processo de anúncio do Evangelho, do seguimento a Jesus Cristo e da formação da comunidade. Os Atos dos Apóstolos nos mostram como foi acontecendo a conversão pessoal e pastoral.

9. Entre os apóstolos, não se pode deixar de destacar o trabalho de Paulo. A experiência do encontro com Cristo no caminho de Damasco deixou-lhe uma profunda marca: Deus o chama para uma grande missão. A graça de Deus trabalha o coração de Paulo bem como o de Ananias. Neste, lhe é quebrada a resistência para que perceba que faz parte da missão que lhe foi confiada na comunidade ir ao encontro de Paulo. É o mesmo Senhor que vai dizer a Ananias: “Vai, porque que este homem é um instrumento que escolhi para levar meu nome às nações pagãs e aos reis, e também aos israelitas. Pois eu vou lhe mostrar o quanto ele deve sofrer pelo meu nome” (At 9,15-16). A vida de Paulo está marcada para sempre pela graça de Deus. A partir da vivência da missão, Paulo vai compreendendo a transformação que está acontecendo em sua vida. Ele, então, afirma: “Sou agradecido àquele que me deu forças, Cristo Jesus, nosso Senhor, pela confiança que teve em mim, colocando-me a seu serviço, a mim que, antes, blasfemava, perseguia e agia com violência. (...) Mas alcancei misericórdia, para que em mim, o primeiro dos pecadores, Jesus Cristo mostrasse toda a sua paciência, fazendo de mim um exemplo para todos os que crerão nele, em vista da vida eterna” (1Tm 1,12-13.16).

10. Que beleza ver Paulo trabalhando incansavelmente para a formação de cristãos leigos missionários como Áquila e Priscila e tantos outros, assim como de comunidades missionárias (Rm 16; 1Cor 16,12.15.17.19)!

11. Até há alguns anos atrás, missão era entendida como tarefa específica para algumas pessoas e grupos: religiosos(as) e padres que vinham para o Brasil ou iam daqui para outros países. A palavra missionário(a) correspondia àquelas pessoas (especialmente religiosos mais idosos) que iam a outros lugares para pregar a missão, identificada com algumas atividades religiosas durante um número determinado de dias.

12. As mudanças ocorridas na sociedade nos últimas décadas foram dando sinais à Igreja de que ela não era mais o centro da sociedade e não tinha mais influência para determinar como se devia viver na família e na sociedade. Numa sociedade marcada pelo pluralismo, relativismo, subjetivismo, pela mentalidade do descartável e do provisório, a Igreja vai assumindo a missão no sentido de ir ao encontro das pessoas para, considerando sua história e a situação em que vive, poder anunciar-lhe Jesus Cristo, oferecendo-lhe oportunidades e meios para o encontro pessoal com ele. É um passo qualitativamente diferente, pois a Igreja que forma discípulos de Jesus Cristo assume que também ela precisa ser discípula.

13. Mas, este caminho ainda não está pronto. Na realidade de hoje, se faz cada vez mais urgente o ir ao encontro das pessoas para dar-lhes atenção entrando em sua casa, sendo próximo delas, acompanhando seus momentos de sofrimento, de alegria e de procura, propondo-lhes o Evangelho de Jesus Cristo, formando pequenos grupos para celebrar a graça do encontro. Precisamos não só compreender essa característica nova da realidade, mas também colocá-la em prática a partir da experiência do encontro com Jesus Cristo pela meditação de sua palavra, pela celebração do seu Mistério Pascal, pela participação na comunidade, pela descoberta de sua presença entre os pobres, pela oração pessoal e comunitária, pelos serviços de solidariedade, pelos gestos de partilha... Afinal de contas, a missão é determinante para a vida do discípulo missionário, da comunidade, da Igreja, visto que é a partir da missão que se compreende melhor o processo do chamado de Deus.

14. A transformação que vem acontecendo contribui para que se compreenda que a missão não pode estar mais restrita a um grupo de pessoas especializadas, mas diz respeito a toda pessoa batizada e que todo discípulo(a) de Jesus Cristo é chamado a ser missionário, não a partir de si, mas daquele que concede a graça para viver em sua comunhão: “Aquele que permanece em mim e eu nele produz muito fruto; porque, sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). Assim, saindo de si, o discípulo missionário vai se convencendo de que é chamado a vivenciar a comunhão com Jesus Cristo e com seu Corpo que é a Igreja. Essa comunhão lhe reveste da força necessária para estabelecer o forte combate contra a centralidade do seu eu, pois se trata de ser discípulo missionário de Jesus Cristo.

15. Também vai-se descobrindo que a missão é para todos os dias da vida e para ser assumida por todos os cristãos em todos os ambientes. É a partir da vida e missão de Jesus que se aprende a ser missionário, a viver a missão; ele é o missionário do Pai, aquele que veio ao mundo para cumprir a vontade daquele que o enviou.

16. É na comunhão com a Igreja que se acolhe a missão. Para todos, mas de modo ainda mais forte para o presbítero diocesano, a presença do Bispo tem um profundo significado, pois é através dele que recebe a missão! Então, este aspecto marca muito sua espiritualidade que, enraizada no Evangelho, o orienta para descobrir a necessidade de conhecer bem o povo que aí vive, pedir a graça a fim de que possa amar sempre esse povo e de colocar-se como servo disponível para o trabalho de evangelização. Esse dinamismo despertará o discípulo missionário para a contemplação da presença de Deus nos acontecimentos da vida das pessoas, das comunidades e da sociedade. À luz da Palavra de Deus, esse exercício continuado permitirá estar ainda mais integrado na missão evangelizadora da Igreja Particular. A vida do discípulo missionário não pode estar limitada a algumas tarefas. Deixando-se guiar pelo Espírito de Deus, vai recebendo e cultivando a graça para se tornar cada vez mais semelhante ao Mestre: semelhante em seu amor que conduz ao despojamento, à missionariedade, à entrega da vida, à obediência à vontade de Deus.



III. Chamados para a vivência em Comunhão

“Vinde e Vede” (Jo 1,39)



1. No trabalho de formação dos seus discípulos, Jesus lhes mostra como é fundamental a vivência em comunhão com Ele e também entre eles. Aquele que diz: “sem mim, nada podeis fazer” (Jo15,5) é o mesmo que adverte: “Entre vós não deve ser assim. Quem quiser ser o maior entre vós seja aquele que vos serve, e quem quiser ser o primeiro entre vós seja o escravo de todos. Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10,43-45). Ele constitui doze e os envia em missão.

2. Após a sua ressurreição, Jesus continua saindo ao encontro dos discípulos para consagrá-los na comunidade e como comunidade.

3. A comunidade formada por Jesus Cristo passa a ter uma ligação tão forte com ele que, como afirma S. Paulo, vai fazer parte do seu Corpo. São muitos os membros, mas um só corpo, um só Espírito que age nos membros para que seja edificado o Corpo de Cristo. A imagem do corpo, mostrando a pluralidade, pede necessariamente a complementaridade de seus membros. É o Espírito de Deus que vai suscitando essa variedade de dons, carismas e ministérios a fim de seja vivenciada como fraternidade e não na competitividade. O outro não é um rival. A graça de Deus vai agindo na vida de cada pessoa para que possa acolher o outro como discípulo de Jesus Cristo e membro da comunidade dos seguidores e testemunhas do Ressuscitado. Cultivando a graça da complementaridade, descobre-se a novidade que o Espírito de Deus vai suscitando!

4. Uma das marcas do mundo atual é a subjetividade que se expressa através do destaque à pessoa em sua dignidade, em suas potencialidades e valores, bem como o subjetivismo que coloca, de tal modo a mesma pessoa no centro, que tudo o mais fica relativizado. Então, o trabalho de evangelização precisa levar em conta essa realidade para que possa ajudar as pessoas a realizarem o encontro pessoal com Jesus Cristo e a assumirem a necessária dimensão eclesial que nasce desse encontro. Assim, o(a) discípulo(a) descobre o sentido da pertença à comunidade e vai aprendendo a alimentar aí a fé que passa a iluminar e guiar sua vida na família, na comunidade e na sociedade.

5. “A vida em comunidade é essencial à vocação cristã. O discipulado e a missão sempre supõem a pertença a uma comunidade. Deus não quis salvar-nos isoladamente, mas formando um Povo. Este é um aspecto que distingue a experiência da vocação cristã de um simples sentimento religioso individual. Por isso a experiência da fé é sempre vivida em uma Igreja Particular” (DA 164). Então, é como membro dessa Igreja Particular, participando da vida em comunidade, organizada também como rede de comunidades, que o cristão é chamado a viver como discípulo(a) missionário(a). Essa participação fortalece a experiência de que “a comunhão e a missão estão profundamente unidas entre si... A comunhão é missionária e a missão e para a comunhão” (ChL 32).

6. Como é grande a responsabilidade de todos os evangelizadores(as) hoje, pois, no processo da educação na fé, se torna necessário colaborar para o nascimento e o fortalecimento e dinamização das comunidades. Se estas não existem, de que adianta proclamar que “a vida em comunidade é essencial à vocação cristã”? Este é um dos grandes desafios para o trabalho de evangelização, especialmente na realidade das grandes cidades!

7. Se há uma relação muito estreita entre vocação cristã e vida em comunidade, não será menos forte e exigente para o ministério ordenado a vivência da dimensão comunitária. Eis o que dizem as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil: “O ministério ordenado necessita recuperar sua vivência colegial. O concílio Vaticano II redescobriu a natureza comunitária do ministério ordenado. Essa “comunhão ministerial” deve ser vivenciada, afetiva e efetivamente, em todos os graus do ministério: na colegialidade episcopal e na corresponsabilidade presbiteral no interior de cada Igreja Particular. A forma individualista do exercício do ministério ordenado, além de ser uma traição à sua própria essência, é um dos principais entraves à realização de uma Igreja toda ela responsável pela missão.

8. O presbítero é, antes de tudo, membro de um presbitério e somente em comunhão com ele pode exercer sua tarefa específica. Ao presbitério como um todo, presidido pelo Bispo, e não aos presbíteros separadamente, é confiado o pastoreio da Igreja Particular. Isso não isenta ninguém de sua responsabilidade pessoal. A ação pastoral do presbitério deve ser vivida como expressão de solidariedade fraterna, na qual todos se sentem corresponsáveis pela tarefa comum e, ainda, mais pela vida e ministério de cada um dos irmãos presbíteros. “O ministério ordenado tem uma radical ‘forma comunitária’ e pode ser assumindo apenas como ‘obra coletiva’” (PDV 17) (DGAE 1999-2002, nºs 327 e 328).

9. Aí, já encontramos vários indicativos para a formação dos cristãos leigos e leigas e dos futuros ministros ordenados.



IV Formação: uma necessidade e um desafio

“Jesus então os chamou e disse: “Sabeis que os que são considerados chefes das nações as dominam e os grandes fazem sentir seu poder. Entre vós não deve ser assim” (Mc 10,42-43).



1. Diante da atual sociedade pluralista e secularizada, faz-se necessário reforçar uma “clara e decidida opção pela formação dos discípulos missionários – os membros de nossas comunidades” (DA 276). O processo formativo da iniciação à vida cristã não é exclusivo dos não batizados, mas se estende também aos batizados não suficientemente evangelizados, que constituem a maioria dos católicos em nosso país. Urge, portanto, uma “identidade católica mais pessoal e fundamentada” (DGAE 88).

2. “O discípulo nasce pelo fascínio do encontro com Cristo e se desenvolve pela força da atração que permanece na experiência de comunhão dos discípulos de Jesus. “A Igreja cresce não por proselitismo mas ‘por atração: como Cristo atrai tudo a si com a força de seu amor’. A Igreja atrai quando vive em comunhão, pois os discípulos de Jesus serão reconhecidos se amarem uns aos outros como Ele nos amou (Cf. Rm 12,4-13; Jo 13,34) (DGAE 89).

3. Paulo, o discípulo missionário, compreendeu muito bem a importância e o caminho da formação. Para ele não se trata apenas de ensinar algumas instruções, mas de ajudar as pessoas a fazerem a alegre experiência do encontro com Jesus Cristo para segui-lo em todas as etapas da vida. Por isso, que, trabalhando com afinco para a formação de discípulos de Jesus Cristo na comunidade dos Gálatas, ele afirma: “Meus filhos, por vós sinto, de novo, as dores do parto, até Cristo ser formado em vós” (Gl 4,19). Aí está o ponto fundamental: formar as pessoas para que cheguem a ter a forma de Cristo, o seu modo. Dirigindo-se à comunidade dos Filipenses, o apóstolo ressalta que assumir o seguimento a Jesus Cristo é entrar no mistério de sua encarnação e de sua páscoa, pois despojou-se, assumindo a forma de escravo, assemelhou-se ao ser humano e humilhou-se, fazendo-se obediente até a morte – e morte de cruz! (cf. Fl 2,5-8).

4. Esse caminho de formação tem por base o conhecimento de Jesus Cristo. “Conhecer Jesus Cristo pela fé é nossa alegria; segui-lo é uma graça, e transmitir este tesouro aos demais é uma tarefa que o Senhor nos confiou ao nos chamar e nos escolher” (DA 18). Só o Espírito Santo nos faz entrar no conhecimento de Jesus Cristo, pois se trata de mergulhar em sua vida fazendo a experiência do encontro com ele para nela se alimentar e dela viver. Ele é o protagonista da formação e missão e, conduzindo a pessoa ao encontro com Jesus Cristo, vai trabalhando o seu coração para que possa acolher essa grande graça: seguir o Filho de Deus que, em assumindo a natureza humana, se fez missionário servo e proclama: “Se alguém quer me servir, siga-me, e onde eu estiver, estará também aquele que me serve” (Jo 12,26).

5. Mas, onde está Jesus Cristo, onde encontrá-lo? Ele “está presente na sua palavra, pois é ele quem fala quando na Igreja se lêem as Sagradas Escrituras” (SC 7). Encontramos Jesus Cristo, de modo admirável, na Sagrada Liturgia. Com o Sacramento da Eucaristia, Jesus nos atrai para si e nos faz entrar em seu dinamismo em relação a Deus e ao próximo. O sacramento da reconciliação é o lugar onde o pecador experimenta de maneira singular o encontro com Jesus Cristo, que se compadece de nós e nos dá o dom de seu perdão misericordioso, nos faz sentir que o amor é mais forte que o pecado cometido, nos liberta de tudo o que nos impede de permanecer em sue amor, e nos devolve a alegria e o entusiasmo de anuncia-lo aos demais e decoração aberto e generoso. A oração pessoal e comunitária é o lugar onde o discípulo, alimenta pela Palavra e pela Eucaristia, cultiva uma relação de profunda amizade com Jesus Cristo e procura assumir a vontade do Pai. Jesus está presente em meio a uma comunidade viva na fé e no amor fraterno. Aí Ele cumpre sua promessa: “Onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles” (Mt 20,18). Ele está em todos os discípulos que procuram fazer sua a existência de Jesus, e viver sua própria vida escondida na vida de Cristo (cf. Cl 3,3). Cristo mesmo está nos pastores, que o representam (cf. Mt 10,40; Lc 10,16). Está naqueles que dão testemunho de luta pela justiça, pela paz e pelo bem comum, algumas vezes chegando a entregar a própria vida em todos os acontecimentos da vida de nossos povos, que nos convidam a procurar um mundo mais justo e mais fraterno, em toda realidade humana, cujos limites às vezes causam dor e nos agoniam” (DA 250; 254; 255; 256).

6. “Também o encontramos de modo especial nos pobres, aflitos e enfermos (cf. Mt 25,37-40) que exigem nosso compromisso e nos dão testemunho de fé, paciência nos sofrimento e constante luta para continuar vivendo. Quantas vezes os pobres e os que sofrem nos evangelizam realmente! No reco0nhecimento dessa presença e proximidade e na defesa dos direitos dos excluídos encontra-se a fidelidade da Igreja a Jesus Cristo, O encontro com Jesus Cristos através dos pobres é uma dimensão constitutiva de nossa fé em Jesus Cristo (DA 257).

7. A piedade popular com as festas dos padroeiros, as novenas, as via-sacras, as procissões, as danças e os cânticos do folclore religioso, o carinho aos santos e aos anjos, as promessas, as orações em família, as peregrinações são também lugar do encontro com Jesus Cristo (DA 259). Na vida dos santos, entre estes os apóstolos de Jesus Cristo, encontramos sinais de quem seguiu Jesus Cristo e de sua morte e ressurreição se tornou testemunha. Mas, não podemos deixar de contemplar a vida de Maria, Mãe de Cristo e nossa Mãe querida! Ela se deixou formar pela graça do Espírito Santo e, desse modo, pôde responder: “Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). “Hoje quando em nosso continente latino-americano e caribenho se quer enfatizar o discipulado e a missão, é ela quem brilha diante de nossos olhos como imagem acabada e fidelíssima do seguimento a Cristo” (DA 270).

8. No processo de formação de discípulos missionários, o Documento de Aparecida ressalta como “o seguimento é fruto de uma fascinação que responde ao desejo de realização humana, ao desejo de vida plena. O discípulo é alguém apaixonado por Cristo, a quem reconhece como o mestre que o conduz e o acompanha” (277).

9. Ainda, destaca cinco aspectos fundamentais que aparecem de maneira diversa em cada etapa do caminho, mas que se complementam intimamente e se alimentam entre si: o encontro com Jesus Cristo; a conversão; o discipulado; a comunhão e a missão (cf. DA 278).

10. A formação do discípulo missionário, pela força do Espírito Santo e da Palavra, “contagia as pessoas e as leva a escutar Jesus Cristo, a crer nEle como seu Salvador e reconhece-lo como quem dá pleno significado a suas vidas e a seguir seus passos”. É e precisa ser formação permanente e dinâmica abrangendo as várias dimensões da vida humana: dimensão humana e comunitária; a espiritual, intelectual e pastoral-missionária (cf. DA 279; 280).

11. Essa formação não pode, em hipótese nenhuma, ignorar a história de cada pessoa, com suas dificuldades, sofrimentos e esperanças muitas vezes escondidas em seu coração. Necessariamente, passa pelo acompanhamento pessoal, seja quando se trata da formação dos cristãos leigos e leigas ou quando diz respeito à formação dos futuros ministros ordenados ou para a vida consagrada.

12. É um processo exigente, pois “quando o impulso do Espírito impregna e motiva todas as áreas da existência, então penetra também e configura a vocação específica de cada pessoa. Cada um das vocações tem um modo concreto e diferente de viver a espiritualidade, que dá profundidade e entusiasmo para o exercício concreto de suas tarefas (cf. 285). “É necessário formar os discípulos numa espiritualidade da ação missionária, que se baseia na docilidade ao impulso do Espírito, à sua potência de vida que mobiliza e transfigura todas as dimensões da existência” (DA 284). É o Espírito Santo quem impulsiona o discípulo missionário para que possa colocar-se sempre a serviço, aprender a dialogar, a dar testemunho de comunhão e anunciar a pessoa e missão de Jesus Cristo.

13. O processo formativo vai acontecendo dentro da realidade do mundo, que é conflitiva e violenta. É em meio a essa realidade vai acontecendo a preparação das lideranças para que possam dar testemunho da fé em Jesus Cristo. É a partir da experiência de celebração, de vivência da fé, de questionamentos, de sofrimentos e esperanças que vai-se dando passos para que seja uma sólida formação em vista do testemunho na realidade da família, do trabalho, da comunidade, da sociedade.

14. A formação dos futuros presbíteros tem uma relação direta com o trabalho de evangelização, ainda mais quando se trata de preparar presbíteros diocesanos. Necessitamos trabalhar para que sejam discípulos missionários de Jesus Cristo que assumiu a natureza humana, “amando os seus até o extremo” e vivenciem o ministério no Espírito de Comunhão Eclesial. É a vida de Jesus Cristo que marca a vida do ministro ordenado a partir de dentro para o serviço ao povo que Deus adquiriu para si pelo sangue de seu Filho (Cf. At 20,28). É necessário que seja aprofundado o sentido da missão que ele recebe, pois esta determina e configura sua identidade. Por isso, a formação não pode se limitar em preparar bons ministros ordenados em vista de cumprirem algumas funções. É toda a vida do ministro ordenado que precisa ser iluminada pela missão que, através do bispo diocesano, ele recebe do próprio Cristo.

15. “Cristo, para continuar no mundo a fazer incessantemente a vontade do Pai mediante a Igreja, atual realmente pelos seus ministros, e assim fica sempre o princípio e a fonte de unidade de sua vida. Portanto, os presbíteros alcançarão a unidade de sua vida, unindo-se a Cristo no conhecimento da vontade do Pai e no dom de si mesmos pelo rebanho que lhes foi confiado. Assim, fazendo as vezes do Bom Pastor, encontrarão no próprio exercício da caridade pastoral o vínculo da perfeição sacerdotal, que conduz à unidade de vida e ação” (PO 14). Nesse momento em que a Igreja enfatiza o discipulado e a missionariedade, é necessário que, na formação, as dimensões pastoral e espiritual possam ganhar maior atenção a fim de que a vida dos futuros presbíteros esteja enraizada de tal modo na vida e missão de Jesus Cristo servo missionário que possam experimentar como o seu amor é sempre a motivação fundamental que sustenta a vida e a missão. Sendo contemplativos na ação, vão aprendendo que a via da missão hoje passa, necessariamente, pelo ir ao encontro das pessoas. Fazendo eles mesmos esse exercício pastoral e motivando grupos, pastorais, movimentos e comunidades para que assumam o dinamismo missionário, o futuro presbítero aprende a ler os sinais da presença do Espírito de Deus, a aprofunda-los à luz da Palavra de Deus, integrar toda essa riqueza na vida de oração pessoal e comunitária e a se perguntar: como ser discípulo missionário hoje?

16. “A conversão pastoral pedida pela Conferência de Aparecida impele-nos a considerar de tal modo a formação dos futuros presbíteros, que possam, com convicção, acolher, no coração, na reflexão e na vida, o profundo sentido de uma Igreja, toda ela, ministerial e missionária. Como convicção, isto não se torna possível sem uma experiência missionária concreta. No processo formativo é indispensável assumir uma pedagogia que valorize e ponha em destaque este novo modo de coordenar e de viver, a fim de que haja efetiva participação dos cristãos leigos e leigas na vida da comunidade e em sua missão evangelizadora” (DGAE 175).




MENSAGEM DO SANTO PADRE
PARA O 46º DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELAS VOCAÇÕES
3 DE MAIO DE 2009 - IV DOMINGO DE PÁSCOA


Tema: «A confiança na iniciativa de Deus e
a resposta humana»

Venerados irmãos no episcopado e no sacerdócio,
queridos irmãos e irmãs!

1. Por ocasião do próximo Dia Mundial de Oração pelas Vocações ao sacerdócio e à vida consagrada, que será celebrado no IV Domingo de Páscoa, dia 3 de Maio de 2009, desejo convidar todo o Povo de Deus a reflectir sobre o tema: A confiança na iniciativa de Deus e a resposta humana. Não cessa de ressoar na Igreja esta exortação de Jesus aos seus discípulos: «Rogai ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a sua messe» (Mt 9, 38). Pedi! O premente apelo do Senhor põe em evidência que a oração pelas vocações deve ser contínua e confiante. De facto, só animada pela oração é que a comunidade cristã pode realmente «ter maior fé e esperança na iniciativa divina» (Exort. ap. pós-sinodal Sacramentum caritatis, 26).
2. A vocação ao sacerdócio e à vida consagrada constitui um dom divino especial, que se insere no vasto projeto de amor e salvação que Deus tem para cada pessoa e para a humanidade inteira. O apóstolo Paulo – que recordamos de modo particular durante este Ano Paulino comemorativo dos dois mil anos do seu nascimento –, ao escrever aos Efésios, afirma: «Bendito seja o Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que, do alto dos céus, nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. Foi assim que n’Ele nos escolheu antes da constituição do mundo, para sermos santos e imaculados diante dos seus olhos» (Ef 1, 3-4). Dentro da vocação universal à santidade, sobressai a peculiar iniciativa de Deus ter escolhido alguns para seguirem mais de perto o seu Filho Jesus Cristo tornando-se seus ministros e testemunhas privilegiadas. O divino Mestre chamou pessoalmente os Apóstolos «para andarem com Ele e para os enviar a pregar, com o poder de expulsar demónios» (Mc 3, 14-15); eles, por sua vez, agregaram a si mesmos outros discípulos, fiéis colaboradores no ministério missionário. E assim no decorrer dos séculos, respondendo à vocação do Senhor e dóceis à ação do Espírito Santo, fileiras inumeráveis de presbíteros e pessoas consagradas puseram-se ao serviço total do Evangelho na Igreja. Dêmos graças ao Senhor, que continua hoje também a convocar trabalhadores para a sua vinha. Se é verdade que, em algumas regiões, se regista uma preocupante carência de presbíteros e que não faltam dificuldades e obstáculos no caminho da Igreja, sustenta-nos a certeza inabalável de que esta é guiada firmemente nas sendas do tempo rumo à realização definitiva do Reino por Ele, o Senhor, que livremente escolhe e convida a segui-Lo pessoas de qualquer cultura e idade, segundo os insondáveis desígnios do seu amor misericordioso.
3. Por conseguinte o nosso primeiro dever é manter viva, através de uma oração incessante, esta invocação da iniciativa divina nas famílias e nas paróquias, nos movimentos e nas associações empenhados no apostolado, nas comunidades religiosas e em todas as articulações da vida diocesana. Devemos rezar para que todo o povo cristão cresça na confiança em Deus, sabendo que o «Senhor da messe» não cessa de pedir a alguns que livremente disponibilizem a sua existência para colaborar mais intimamente com Ele na obra da salvação. Entretanto, por parte daqueles que são chamados, exige-se-lhes escuta atenta e prudente discernimento, generosa e pronta adesão ao projeto divino, sério aprofundamento do que é próprio da vocação sacerdotal e religiosa para lhe corresponder de modo responsável e convicto. A propósito, o Catecismo da Igreja Católica recorda que a livre iniciativa de Deus requer a resposta livre do ser humano. Uma resposta positiva que sempre pressupõe a aceitação e partilha do projeto que Deus tem para cada um; uma resposta que acolhe a iniciativa amorosa do Senhor e se torna, para quem é chamado, exigência moral vinculativa, homenagem de gratidão a Deus e cooperação total no plano que Ele prossegue na história (cf. n. 2062).
4. Ao contemplar o mistério eucarístico – onde se exprime sumamente o dom concedido livremente pelo Pai na Pessoa do Filho Unigénito pela salvação dos homens, e a disponibilidade plena e dócil de Cristo para beber completamente o «cálice» da vontade de Deus (cf. Mt 26, 39) – compreendemos melhor como «a confiança na iniciativa de Deus» molde e dê valor à «resposta humana». Na Eucaristia, dom perfeito que realiza o amoroso projeto da redenção do mundo, Jesus imola-Se livremente pela salvação da humanidade. «A Igreja – escreveu o meu amado predecessor João Paulo II – recebeu a Eucaristia de Cristo seu Senhor, não como um dom, embora precioso, entre muitos outros, mas como o dom por excelência, porque dom d’Ele mesmo, da sua Pessoa na humanidade sagrada, e também da sua obra de salvação» (Carta enc. Ecclesia de Eucharistia, 11).
5. Quem está destinado a perpetuar este mistério salvífico ao longo dos séculos, até ao regresso glorioso do Senhor, são os presbíteros, que podem precisamente contemplar em Cristo eucarístico o modelo exímio de um «diálogo vocacional» entre a livre iniciativa do Pai e a resposta confiante de Cristo. Na celebração eucarística, é o próprio Cristo que age naqueles que Ele escolhe como seus ministros; sustenta-os para que a sua resposta cresça numa dimensão de confiança e de gratidão que dissipe todo o medo, mesmo quando se faz mais intensa a experiência da própria fraqueza (cf. Rm 8, 26-30), ou o ambiente se torna mais hirto de incompreensão ou até de perseguição (cf. Rm 8, 35-39).
6. A consciência de sermos salvos pelo amor de Cristo, que cada Eucaristia alimenta nos crentes e de modo especial nos sacerdotes, não pode deixar de suscitar neles um confiante abandono a Cristo que deu a vida por nós. Deste modo, acreditar no Senhor e aceitar o seu dom leva a entregar-se a Ele com ânimo agradecido aderindo ao seu projeto salvífico. Se tal acontecer, o «vocacionado» de bom grado abandona tudo e entra na escola do divino Mestre; inicia-se então um fecundo diálogo entre Deus e a pessoa, um misterioso encontro entre o amor do Senhor que chama e a liberdade do ser humano que Lhe responde no amor, sentindo ressoar no seu espírito as palavras de Jesus: «Não fostes vós que Me escolhestes, fui Eu que vos escolhi e vos nomeei para irdes e dardes fruto, e o vosso fruto permanecer» (Jo 15, 16).
7. Este amoroso enlace entre a iniciativa divina e a resposta humana está presente também, de forma admirável, na vocação à vida consagrada. Recorda o Concílio Vaticano II: «Os conselhos evangélicos de castidade consagrada a Deus, de pobreza e de obediência, visto que fundados sobre a palavra e o exemplo de Cristo e recomendados pelos Apóstolos, pelos Padres, Doutores e Pastores da Igreja, são um dom divino, que a mesma Igreja recebeu do seu Senhor e com a sua graça sempre conserva» (Const. dogm. Lumen gentium, 43). Temos de novo aqui Jesus como o modelo exemplar de total e confiante adesão à vontade do Pai para onde deve olhar a pessoa consagrada. Atraídos por Ele muitos homens e mulheres, desde os primeiros séculos do cristianismo, abandonaram a família, os haveres, as riquezas materiais e tudo aquilo que humanamente é desejável, para seguir generosamente a Cristo e viver sem reservas o seu Evangelho, que se tornou para eles escola de radical santidade. Ainda hoje são muitos os que percorrem este itinerário exigente de perfeição evangélica, e realizam a sua vocação na profissão dos conselhos evangélicos. O testemunho destes nossos irmãos e irmãs, tanto nos mosteiros de vida contemplativa como nos institutos e nas congregações de vida apostólica, recorda ao povo de Deus «aquele mistério do Reino de Deus que já actua na história, mas aguarda a sua plena realização nos céus» (Exort. ap. pós-sinodal Vita consecrata, 1).
8. Quem pode considerar-se digno de ingressar no ministério sacerdotal? Quem pode abraçar a vida consagrada contando apenas com os seus recursos humanos? Mais uma vez convém reafirmar que a resposta da pessoa à vocação divina – sempre que se esteja consciente de que é Deus a tomar a iniciativa e é Ele também a levar a bom termo o seu projeto salvífico – não se reveste jamais do cálculo medroso do servo preguiçoso, que por medo escondeu na terra o talento que lhe fora confiado (cf. Mt 25, 14-30), mas exprime-se numa pronta adesão ao convite do Senhor, como fez Pedro quando, apesar de ter trabalhado toda a noite sem nada apanhar, não hesitou em lançar novamente as redes confiando na palavra d’Ele (cf. Lc 5, 5). Sem abdicar de forma alguma da responsabilidade pessoal, a resposta livre do homem a Deus torna-se assim «corresponsabilidade», responsabilidade em e com Cristo, em virtude da ação do seu Santo Espírito; faz-se comunhão com Aquele que nos torna capazes de dar muito fruto (cf. Jo 15, 5).
9. Emblemática resposta humana, repleta de confiança na iniciativa de Deus, é o «Amen» generoso e total da Virgem de Nazaré, pronunciado com humilde e decidida adesão aos desígnios do Altíssimo, que lhe foram comunicados pelo mensageiro celeste (cf. Lc 1, 38). O seu «sim» pronto permitiu-Lhe tornar-Se a Mãe de Deus, a Mãe do nosso Salvador. Maria, depois deste primeiro «fiat», teve de o repetir muitas outras vezes até ao momento culminante da crucifixão de Jesus, quando «estava junto à cruz», como refere o evangelista João, compartilhando o sofrimento atroz do seu Filho inocente. E foi precisamente da cruz que Jesus agonizante no-La deu como Mãe e a Ela nos entregou como filhos (cf. Jo 19, 26-27) – Mãe especialmente dos sacerdotes e das pessoas consagradas. A Ela quero confiar todos quantos sentem o chamamento de Deus para caminhar pela senda do sacerdócio ministerial ou da vida consagrada.
10. Queridos amigos, não desanimeis perante as dificuldades e as dúvidas; confiai em Deus e segui fielmente Jesus e sereis as testemunhas da alegria que brota da união íntima com Ele. À imitação da Virgem Maria, que as gerações proclamam bem-aventurada porque acreditou (cf. Lc 1, 48), empenhai-vos com toda a energia espiritual na realização do projeto salvífico do Pai celeste, cultivando no vosso coração, como Ela, a capacidade de maravilhar-se e adorar Aquele que tem o poder de fazer «grandes coisas», porque Santo é o seu nome (cf. Lc 1, 49).

Vaticano, 20 de Janeiro de 2009.



CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
Comissão Episcopal Pastoral para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada
Pastoral Vocacional (PV) / Serviço de Animação Vocacional (SAV)


CMOVC/ SAV (02)
Maio de 2009


Pastoral Vocacional[1]

A Pastoral Vocacional, como parte integrante da vida da Igreja, é uma das suas preocupações fundamentais. Constitui, por isso, uma prioridade pastoral. “Um generoso empenho certamente há-de ser posto – sobretudo através de uma oração insistente ao Senhor da messe (cf. Mt 9,38) – na promoção das vocações ao sacerdócio e de especial consagração. Trata-se dum problema de grande importância para a vida da Igreja em todo o mundo”.

PRINCÍPIOS DA PASTORAL VOCACIONAL

Chamados à comunhão
A ação vocacional na pessoa só pode acontecer num dinamismo de aliança e de comunhão com Deus no amor. Consciente de que foi escolhido por Deus desde sempre, o indivíduo que é chamado deixa-se envolver na aventura da relação e do amor. Homem de Deus que faz uma experiência diária de comunhão e de diálogo com Deus, o chamado descobre os projetos de Deus, identifica-se com eles e aceita testemunhá-los no mundo. O amor de Deus que lhe enche o coração, compromete-o no amor aos irmãos. “É por isso que todos saberão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35). A caridade é verdadeiramente o coração da Igreja, o amor é a chave de todas as vocações, no dizer de S. Teresa de Lisieux: “Compreendi que a Igreja tem um coração, um coração ardente de amor; compreendi que só o amor fazia atuar os membros da Igreja; compreendi que o amor encerra em si todas as vocações, que o amor é tudo”.
Falar da vocação e das vocações significa falar da realidade mais profunda da pessoa. Não se trata apenas de buscar a satisfação de um mero desejo pessoal ou de se sentir realizado em determinadas tarefas gratificantes. É um processo que se passa ao nível mais profundo da pessoa. O mais importante e decisivo é a resposta ao chamamento a seguir Jesus na Igreja e a continuar a sua missão no mundo, que pode levar à consagração total da pessoa. Qualquer tipo de vocação assumida nesta perspectiva, abre para um projeto belo e nobre de realização da pessoa humana nas suas mais profundas aspirações: no dom de si, na relação com os outros, na transformação da sociedade e do mundo, segundo o projeto salvífico de Deus.
A ação vocacional procede da decisão amorosa e maternal da Igreja de prestar o melhor serviço a todas e a cada uma das pessoas, para serem elas mesmas segundo o projeto de Deus, para descobrirem “o dom de Deus” e o Seu amor incondicional e único e para assumirem o serviço salvífico que devem prestar na Igreja e no mundo.
A ação vocacional tem como dever “premente e irrecusável anunciar e testemunhar o sentido cristão da vocação”, a boa notícia do chamamento. O povo cristão tem direito a escutar este “Evangelho da Vocação”.
A ação vocacional deve procurar atingir todas as pessoas, em todas as idades e ao longo de toda a vida. A pastoral vocacional não conhece fronteiras; dirige-se a todos e não apenas a algumas pessoas privilegiadas, porque todo o ser humano tem o desejo de conhecer o sentido da vida e do seu lugar na história; é uma proposta contínua que não acontece apenas uma vez na vida; não é só para jovens, pois o convite do Senhor a segui-lo dirige-se a todas as idades e a vocação considera-se plenamente realizada na hora da morte.
A ação vocacional acontece no mistério de Deus:
· parte do Mistério de Deus para reconduzir ao mistério do homem,
· parte da centralidade da Ressurreição de Cristo na vida da Igreja e na vocação para provocar a resposta da pessoa,
· parte do dinamismo radical da escatologia para captar os sinais do Espírito na história. Sem esta abertura ao mistério em sentido pleno, não existe vocação nem pastoral vocacional. A pessoa humana realiza-se vocacionalmente neste movimento que envolve toda a sua vida e que é o fundamento do caminho de discernimento vocacional.
Chamados a anunciar o Evangelho da Esperança
Toda a pastoral da Igreja tem o seu fundamento teológico na eclesiologia renovadora do Concílio Vaticano II, que define a Igreja como comunhão e missão. A comunhão encarna e manifesta a essência da Igreja.
“Promover uma espiritualidade de comunhão, elevando-a ao nível de princípio educativo em todos os lugares onde se plasma o homem e o cristão, onde se educam os ministros do altar, os consagrados, os agentes pastorais, onde se constroem as família e as comunidades…”, antes de quaisquer programas, iniciativas ou ações pastorais, é o grande desafio para todos os que procuram ser fiéis ao desígnio de Deus e corresponder às expectativas do mundo.
A pastoral das vocações, situa-se na compreensão da Igreja como comunhão e missão. Sendo assim, os vocacionados ao ministério dão continuidade ao serviço de Jesus, ungido pelo Espírito Santo, para levar a Boa Nova aos pobres, a luz aos que andam nas trevas, a liberdade aos que estão prisioneiros, a vida a todos os homens.
Toda a vocação na Igreja está ao serviço da santidade. Algumas, como a vocação ao ministério ordenado e à vida consagrada, fazem-no de modo singular. A vocação sacerdotal é essencialmente uma chamada à santidade na forma que nasce do Sacramento da Ordem. A santidade é intimidade com Deus, é imitação de Cristo pobre, casto e humilde; é amor sem reserva às almas e entrega pelo seu próprio bem; é amor à Igreja que é santa e nos quer santos, porque assim é a missão que Cristo lhe confiou. Cada um de vós deve ser santo também para ajudar os irmãos a seguir a sua vocação à santidade. A vida consagrada revela a íntima natureza de toda a vocação cristã à santidade e a tensão de toda a Igreja-Esposa para Cristo, seu único Esposo, apontando para o valor absoluto e escatológico da proposta de vida assumida.
A Igreja, chamada por Deus, constituída no mundo como comunidade de chamados, é, por sua vez instrumento do chamamento de Deus. A comunidade que toma consciência de ser chamada, ao mesmo tempo toma consciência de que deve chamar continuamente. Através e ao longo desse chamamento, nas suas várias formas, flui também o apelo que vem de Deus.
Neste sentido a Igreja é mãe das vocações, geradora e educadora de vocações: com a força do Espírito, faz nascer, protege e alimenta; procura que tenham uma adequada formação inicial e permanente, acompanhando-as ao longo do caminho.

ORIENTAÇÕES PARA A PASTORAL VOCACIONAL

Linhas de ações da Pastoral Vocacional
Uma cultura do chamamento
Comunidade de chamados, a Igreja chama. As novas condições históricas e culturais exigem que a pastoral das vocações seja vista como um dos objetivos primários de toda a comunidade cristã. Isto supõe e exige dar início a uma cultura do chamamento, ou seja, passar de uma atitude da espera e do acolhimento dos que se sentem chamados e se oferecem para as diversas vocações, especialmente para o sacerdócio ministerial e para a vida de especial consagração religiosa e secular, a uma pastoral da proposta direta, do convite e do chamamento pessoal.
A responsabilidade é de toda a Igreja
Todos e cada um dos membros da Igreja devem ser mediadores da proposta vocacional. Os Bispos e os Presbíteros têm um lugar especial nesta mediação que, de modo algum, se esgota neles. Por força da sua fé, o discípulo de Jesus deve tomar sobre si a vocação do outro. O ministério do apelo vocacional diz respeito a todo o cristão: aos pais, aos catequistas, aos educadores, aos professores, em especial os professores de Educação Moral e Religiosa Católica, e não apenas aos bispos, presbíteros e diáconos ou aos consagrados da vida religiosa e secular.
Do mesmo modo, o apelo vocacional, deve ser uma ação que envolve toda a comunidade nas suas diversas expressões: famílias cristãs, grupos, movimentos, paróquias, dioceses, institutos religiosos e seculares.
A ação vocacional é a categoria unificadora da pastoral em geral
Acolhendo os sinais da presença do Espírito na Igreja, trata-se antes de qualquer coisa de introduzir o anúncio vocacional nos sulcos da pastoral ordinária. O objetivo da pastoral e o critério de avaliação está nessa relação intrínseca com a dimensão vocacional.
A pastoral vocacional entende-se em íntima relação com as outras dimensões da pastoral (familiar e cultural, litúrgica e sacramental), com a catequese e as formas de catecumenato, com os vários grupos de animação e formação cristã, com os movimentos e, especialmente, com a pastoral juvenil. Em todo este processo terá um papel importante a solicitude dos pais cristãos.
Dom do Pai e situadas no plano do mistério que só Deus conhece e pode revelar, as vocações nascem e desenvolvem-se graças à mediação da Igreja orante. Na verdade, Deus ao prometer à sua Igreja pastores segundo o seu coração, também diz: “Rogai ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a Sua messe” (Mt 9,38). Por isso, a oração, que empenha não apenas os indivíduos, mas também todas as comunidades eclesiais, é a base de toda a pastoral vocacional e é caminho para o discernimento vocacional.
A oração, em particular, a eucaristia e a adoração eucarística, possibilita o encontro profundo do orante com a pessoa de Jesus Cristo em toda a sua plenitude e a resposta ao seu chamamento, deixando tudo para segui-lo.
Redescobrir o acompanhamento espiritual pessoal.
Para cumprir a sua missão de guia de cada pessoa na descoberta da própria vocação, a ação vocacional deve empenhar-se na redescoberta da tradição do acompanhamento espiritual pessoal mediante o qual se visibiliza o acompanhamento do Mestre interior que é o Espírito, o grande animador de toda a vocação, Aquele que acompanha o caminho para que chegue à meta.
Viver a alegria da fidelidade à vocação
A ação vocacional deve ajudar a viver fielmente aqueles que foram chamados a uma determinada vocação. Insere-se no dinamismo de uma autêntica pastoral de fidelidade à própria vocação, que tem por base a dimensão testemunhal da vocação como caminho de felicidade no serviço da Igreja.
Fomentar as experiências do voluntariado
A ação vocacional deverá fomentar e apoiar as experiências do voluntariado como “pastoral do serviço” gratuito, especialmente aos mais pobres e necessitados, educando para o valor do sacrifício, da doação incondicional e gratuita, para o empenhamento desinteressado, para aceitar o convite a perder a vida. Deste modo, o voluntariado converter-se-á em caminho de compromissos progressivos que podem levar, de chamamento em chamamento, a decisões definitivas, até numa vocação de especial consagração.

Desafios à Pastoral Vocacional

Necessidade e urgência de uma estrutura global
Falando especificamente das vocações ao sacerdócio e de especial consagração, João Paulo II propõe esta orientação fundamental para o novo milênio: “é necessário e urgente estruturar uma vasta e capilar pastoral das vocações, que envolva as paróquias, os centros educativos, as famílias, suscitando uma reflexão mais atenta sobre os valores essenciais da vida, cuja síntese decisiva está na resposta que cada um é convidado a dar ao chamamento de Deus, especialmente quando este pede a total doação de si mesmo e das próprias forças à causa do Reino”.
A recente Exortação Apostólica Ecclesia in Europa fala da vocação como missão de toda a Igreja ao serviço do Evangelho da esperança: “Servir o Evangelho da esperança com uma caridade que evangeliza é obrigação e responsabilidade de todos. De fato, seja qual for o carisma e o ministério de cada um, a caridade é a estrada mestra apontada a todos e que todos podem percorrer: é a estrada que toda a comunidade eclesial é chamada a percorrer seguindo as pegadas do seu Mestre”.
Nova cultura vocacional
Promover uma cultura da vocação implica fomentar a cultura da vida e da abertura à vida, discernir o significado do viver e do morrer, incentivar a busca de sentido e o desejo da verdade, colocar as grandes perguntas que dão sentido pleno às pequenas respostas que provocam grandes decisões, como a opção pela fé. A penúria das “vocações específicas” tem a ver com a ausência de cultura da vocação, apoiada num modelo de homem sem vocação. Esta nova cultura vocacional, inerente a todo o crente e à comunidade cristã, abrange todo um conjunto de valores não muito emergentes na cultura atual: a gratidão, o acolhimento do mistério, a compreensão do homem como ser na sua finitude, a abertura ao transcendente, a disponibilidade em se deixar chamar pelos outros ou pelo Outro, a confiança em si próprio e no próximo, a liberdade de acolher responsavelmente o dom recebido.
“Salto de qualidade” na pastoral vocacional.
Este “salto de qualidade” significa a exigência de uma mudança radical, que tenta compreender a direção que Deus está a imprimir à nossa história:
· a pastoral das vocações como expressão da maternidade da Igreja, aberta ao plano de Deus que nela gera vida; a promoção de todas as vocações;
· a coragem de apresentar a todos o anúncio e a proposta vocacional;
· a atividade vocacional marcada pela esperança cristã, que nasce da fé e se projeta na novidade e no futuro de Deus;
· a certeza de que em toda a pessoa há um dom de Deus à espera de ser descoberto;
· o objetivo da promoção vocacional como serviço à pessoa para que saiba discernir o projeto de Deus na sua vida para a edificação da comunidade;
· a certeza de que Deus continua a chamar em toda a Igreja e em todo o lugar;
· a educação vocacional inspirada no método do acompanhamento;
· o animador vocacional como educador para a fé e formador de vocações, numa ação mais conjunta;
· a coragem do inconformismo e do questionamento, na busca de um novo impulso criativo e testemunhal;
· a vocação como realização profunda da pessoa, na resposta ao chamamento especial de Deus.

ESTRUTURAS PASTORAIS

A Igreja como comunidade de convocados deve manifestar em toda a sua ação vocacional a comunhão das diferentes vocações entre si e a preocupação por todas as vocações. Por isso, na direção, na orientação e nas atividades de todos os organismos e estruturas, a nível paroquial, diocesano e nacional, deverão estar representadas, na sua pluralidade, as vocações e ministérios eclesiais. Esta exigência não corresponde apenas a uma questão meramente organizativa, mas é manifestação e fruto do espírito novo que deve estar presente na pastoral vocacional da Igreja, que é o espírito de comunhão. “A crise vocacional é também crise de comunhão em promover e fazer crescer as vocações”. As vocações desenvolvem-se onde se vive um espírito autenticamente eclesial, numa Igreja como comunhão.
Dissemos que toda a ação pastoral tem uma dimensão vocacional. Nesse sentido, temos a tarefa de promover formas para que esse dinamismo vocacional se concretize nas nossas Igrejas particulares: “o Bispo há-de procurar que a pastoral juvenil e vocacional seja confiada a sacerdotes e outras pessoas capazes de transmitirem, com o entusiasmo e o exemplo da sua vida, o amor a Jesus. A sua missão será acompanhar os jovens, por meio duma relação pessoal de amizade e, se possível, de direção espiritual, para ajudá-los a identificarem os sinais de vocação de Deus e a buscarem a força para lhe corresponder na graça dos sacramentos e na vida de oração, que é primariamente uma escuta de Deus que fala”.
Nas dioceses e paróquias, famílias e centros educativos, movimentos e institutos de vida consagrada, é urgente e necessário que todos se envolvam nas estruturas da pastoral das vocações de uma maneira empenhada e interpeladora.

CONCLUSÃO

Vivemos um tempo de perplexidade e de esperança. No Espírito, somos interpelados a atitudes positivas de confiança. Deus não abandona o Seu Povo. Este será servido e a ele será anunciada a Boa Nova por instrumentos mediadores adaptados aos tempos. Os modos terão de ser diferentes; a atitude de chamamento e resposta não podem mudar, são algo de permanente. Deus escolhe e chama, o homem responde livremente a esse apelo.
O problema das vocações tem raízes profundas. As vocações específicas, sacerdotais e de especial consagração, precisam de um húmus apropriado. É preciso transformar a cultura, recuperar os valores, reencontrar o interesse pelas grandes questões da vida, retomar o sentido do mistério e do transcendente, ousar sonhar e ter ideais, cuidar da qualidade evangélica da vida cristã. É uma questão de vida da fé, que diz respeito a todos os cristãos.
Novas vocações surgirão na medida em que houver compromisso e testemunho da vocação batismal, comunidades eclesiais entusiasmadas com a presença do Ressuscitado e capazes de anunciar o Evangelho transformador da esperança.
Na proposta vocacional, procurem as nossas comunidades eclesiais ser mais entusiastas e entusiasmadoras, mais alegres e vivas, menos tímidas e mais arrojadas, mais corajosas e encorajadoras, mais otimistas e portadoras de esperança.
É hora de chamar com a audácia dos verdadeiros apóstolos. Também aqui é imperioso “fazer-se ao largo” numa mentalidade nova e com iniciativas diferentes.
É fundamental suscitar e acompanhar vocações à maneira de Jesus: semear, acreditando que é Deus quem semeia; acompanhar, fazendo caminho com aquele que é chamado à vocação; descobrir que Jesus faz caminho com aquele que se vê chamado; falar com clareza e exigência, apelando ao testemunho da radicalidade e à imitação de Cristo sem reservas; ajudar a tomar decisões e a comprometer-se; ajudar a descobrir critérios de discernimento vocacional.
O futuro da fé cristã passa pelo cuidado das vocações. Face à cultura dominante e à carência de seminaristas e de aspirantes à vida religiosa, a pastoral das vocações tem um papel determinante em suscitar, acompanhar e ajudar a discernir o serviço dos ministros ordenados e dos consagrados, numa Igreja que deseja anunciar, celebrar e servir o Evangelho da esperança.
A quantos têm dedicado o seu melhor entusiasmo a esta causa deixamos uma palavra de gratidão e apreço, certos de que o Senhor da messe os recompensará abundantemente.
Exortamos todos os fiéis, em particular os jovens, para que tenham o coração aberto ao chamamento do Senhor Jesus que convida a segui-lo, Ele que é Caminho, Verdade e Vida. Só Ele é sentido pleno para a vida. Que a procura de Deus na oração e a atenção aos sinais dos tempos sejam atitudes constantes que possibilitem o acolhimento dos apelos de Deus, como resposta à vocação e desafio à missão.
Exortamos todos os que aceitam o convite do Senhor a segui-Lo de maneira mais radical - presbíteros, diáconos e consagrados religiosos e seculares - a que vivam e atuem de forma coerente com a sua opção vocacional. Sejam testemunhas alegres e autênticas de Cristo Ressuscitado como única esperança para o mundo. Vivam em gratuidade total o amor e o serviço à causa do Reino.
Exortamos as famílias, os catequistas e os professores cristãos a que promovam uma autêntica cultura vocacional, ajudando os jovens a descobrir o projeto que Deus tem para cada um, cultivando a disponibilidade em fazer da vida um dom para a missão, motivando-os para o encontro pessoal com o Senhor. Encorajamos as famílias a viverem como verdadeiras “igrejas domésticas”, sendo espaços que possibilitem o surgir das diferentes vocações.
Que a Virgem Maria, a mulher orante que na escuta de Deus soube dizer sim, seja modelo de disponibilidade total para aqueles que aceitam o projeto de Deus e geradora de vocações ao serviço da Igreja para a vida do mundo.
[1] Guia da Pastoral Vocacional, Comissão Episcopal Pastoral para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada.